Numa das poucas entrevistas de Viajo porque preciso, volto porque te amo, de Marcelo Gomes e Karin Ainouz, uma garota de programa de beira de estrada é acuada pelo protagonista, vivido por Irandhir Santos. Muito à vontade, ela responde às perguntas do protagonista. A garota diz que busca uma “vida lazer”. O que é uma “vida lazer”, devolve Irandhir? Uma vida sossegada, ao lado da sua filha, um companheiro, um lar, amor, sentir-se amada…. ela responde algo nesses termos.

Pois, o personagem de Irandhir, a quem nunca vemos, apenas escutamos durante todo o filme, está na estrada porque foi abandonado pela namorada. Ele busca o sertão do nordeste como alguém que busca encontrar-se… ou perder-se de vez! Encontra paisagens áridas, melancolia, abandono e muito desejo de viva. De uma vida lazer!

Irandhir e a garota de programa de beira de estrada buscam a mesma coisa. São iguais na diferença.

Aos poucos, a cada novo encontro, a cada nova pessoa no caminho, o estado de ânimo do protagonista transforma-se, revigora-se, até atingir as belas praias de Acapulco.

Não é um filme sobre o sertão, nem sobre o urbano. É sobre estados de alma, que convergem, se deparam, seja onde estiver.

A história do longa é simples, a inteligência farta. O texto é estruturante. As imagens, de formatos e texturas diversas, ligam-se harmoniosamente. Não se perdem, estão amparados pela palavra.

O trabalho de som amplia os significados das imagens, ajuda a provocar sensações de conforto e abandono.

Viajo porque preciso, volto porque te amo é um filme de extrema liberdade. Revela-se solto das amarras da hierarquia, do set de filmagem, da perfeição técnica. Existe como manifesto de amor à vida e ao fazer cinema.

 

Por Cláudio Marques

Visto no Cinema da Fundação, Recife