Por Cláudio Marques
Mais do que explorar as mazelas do mundo político, há em Tudo pelo Poder (Ides of March), dirigido por George Clooney, a revelação dos caminhos que levam e mantém as pessoas no posto mais elevado de suas atividades. Tudo pelo Poder trata de um ritual de transformação. Perde-se o romantismo, risca-se endurecer até colocar em jogo a própria alma.
Stephen Meyers (Ryan Gosling) é o assessor de imprensa do candidato democrata à Presidência dos EUA, Mike Morris (George Clooney). Lembremos que os democratas representam os políticos mais bacanas dos EUA. Ou menos escroques.
Stephen é um jovem idealista, escreve com vigor os discursos de Mike sobre desarmamento, sustentabilidade, economia e outros temas. Ele acredita no político, quer vê-lo eleito para que seu trabalho e pensamento transformem os EUA e o mundo como um todo num lugar melhor. Philip Seymouy Hoffman dá corpo e alma a Paul Zara, coordenador da campanha de Mike Morris, outra peça chave dessa trama.
A confusão começa quando Stephen aceita encontrar-se com Tom Duffy (Paul Giamantti) um áspero e experiente coordenador da campanha rival. Há o convite para que o jovem brilhante passe para o lado de lá da campanha, algo rechaçado por Stephen. Mas, o pecado da vaidade já o havia comprometido. O envolvimento com uma jovem estagiária de 20 anos o complicará de vez, em lances que envolvem chantagem e mudanças estratégicas de conceitos e ideais de vida. Tudo para alcançar e se manter no topo.
Ok que no momento da virada do filme há que se contar um tanto com a simpatia do espectador, pois as coisas que formam o triângulo Sthephen-estagiária-Mike acontecem muito rapidamente, talvez não com a desenvoltura e maturação necessárias.
Mas, Tudo Sobre o Poder se inscreve na tradição das grandes atuações do cinema norte-americano. Os atores estão seguros, são carismáticos. São eles que conferem credibilidade às ações do filme.
O filme contém bons diálogos, mas certamente excessivos, que nos levam aos planos e contra-planos funcionais e que deixam Tudo pelo Poder um pouco mais pobre. É um filme um tanto quanto “preguiçoso” nesse sentido, talvez pelo próprio acúmulo de funções de George Clooney. Talento, mesmo, não parece faltar e aparece com força em alguns poucos momentos de maior elaboração cinematográfica.
Como na seqüência em que o candidato Mike Morris, ameaçado em uma grave crise moral que pode explodir a qualquer momento, tem de tomar certa decisão. Ele convoca Paul Zara para o seu carro, num beco ao lado do hotel. Vemos o carro, compreendemos a gravidade da situação e sabemos das possibilidades e rumos da conversa, mas nada escutamos. São alguns segundos de bastante tensão, em que a mente do espectador trabalha bastante, compõem as suas próprias variáveis. Acompanhamos a tudo do lado de fora, em silêncio. Tempo depois, Paul desce do carro e no movimento de corpo compreendemos para que rumo a história irá migrar.
O plano final, com o olhar fixo e robotizado de Stephen, diz mais que centenas de palavras. O diabo já o incorporou.
E, voltando ao que foi desenhado no início desse texto, o diabo e o desejo de poder não estão somente onde o político tradicional se senta, mas em todo canto, em todas as profissões, em cada um de nós.