Submarino

Por Luis Fernando Pereira

Já me vi por diversos momentos refletindo sobre o quão minha vida seria diferente caso tivesse vivenciado, até mesmo presenciado algo de trágico na infância. Será que teria eu alguma capacidade de superação, seguindo assim o curso da vida sem sequelas? Será que conseguiria, mesmo com cicatrizes latentes, vencer esses possíveis traumas e de alguma forma viver bem? Ou será que minha personalidade seria uma consequência direta e imediata de tal acontecimento, fazendo-me emperrar no que chamamos de tempo, levando-me com isso pra um constante estado de estagnação, de desesperança, vivendo por anos e anos com este fato arraigado na cabeça?

Com esta última resposta em mente, vos apresento Submarino, de Thomas Vinterberg.

Não custará muito tempo para o leitor e espectador compreender o real significado do parágrafo acima, já que logo aos primeiros instantes da trama somos apresentados aos dois principais envolvidos na reflexão. Assistimos, numa espécie de preâmbulo, Nick (Sebastian Bull Sarning) e seu irmão (Mads Broe Andersen) tomando conta de um bebê, o então caçula da família, pois sua mãe, constantemente embriagada, já não mais consegue. Certo dia, porém, os dois, então pré-adolescentes, adormecem após uma noite regada com muita vodca, e que acaba acarretando na prematura morte do bebê.

Partindo deste fúnebre evento, Vinterberg constrói sua história: um drama denso, cercado de pessimismo e possuidor de um vazio existencial provocador.

Findada a tragédia que serve de premissa, a narrativa entra numa grande elipse, transportando seus personagens para a meia idade. Aqui, na primeira sequência pós-evento, observa-se um Nick (agora interpretado por Jakob Cedergren) com olhar visivelmente perdido caminhando pelas ruas da cidade e, assim que avista um carrinho de bebê, vê-se afrontado pela câmera; ele reage, fazendo-nos automaticamente perceber que ele não superou o trauma vivido na infância.

A partir de então a trama apresenta diversas situações que reafirmam esta perspectiva, utilizando-se para isso de uma atmosfera cinzenta, arquitetada por uma fotografia preenchida por paisagens mortas, e de um interessante trabalho cenográfico, onde há sempre pouco espaço para ser mostrado e quando o são, percebe-se uma completa ausência de cores fortes, perpassando um ar de inalterável tristeza.

O roteiro, assinado por Thomas Vinterberg, Jonas T.Bengtsson e Tobias Lindholm apresenta qualidades, mas também defeitos. O primeiro capítulo, por assim dizer, é competente ao apresentar o contexto no qual Nick é envolvido: sua relação amorosa bastante peculiar, a amizade com um sujeito de conduta visivelmente confusa e sua busca pelo irmão, afastados já há algum tempo. Contudo, a tentativa de emoldurar uma trama mais engenhosa acaba não agregando tanto valor, pois é de fácil captação pelo espectador. Presumimos com certa rapidez os próximos passos que serão dados pelo personagem, o que não seria problema algum caso o roteiro tivesse este viés em mente.

O capítulo seguinte apresenta o drama vivido pelo seu irmão (vivido agora por Peter Plaugborg), obrigado a esconder do filho menor sua dependência química. Nesta parte, Vinterberg é bem feliz ao conduzir o personagem pra reprodução de todo um contexto que vivenciara na infância: desde a falta de maturidade ao colocar uma criança no mundo, até as constantes derrotas perante o vício, no caso agora, da heroína. Nesta parte da trama há o entrelaçamento das histórias, trazendo à tona toda a preocupação dos roteiristas em oferecer uma construção narrativa mais elaborada e não linear. O resultado não compromete, mas também não proporciona entusiasmo, pois, como já afirmado, não é de difícil percepção pelo espectador.

Submarino mostra-se um drama poderoso, construidor de uma história de gradativa imersão à tristeza, que conduz o espectador às profundezas de almas desesperançadas, fazendo-me mais uma vez pensar numa das questões que introduziram este texto. Será que uma vez acometido por um trauma, não mais há possibilidade de salvação?

Thomas Vinterberg acabou de me responder.