Por Rafael Saraíva
Diz o ditado que em time que está ganhando não se mexe. Então, possivelmente animada pelo bom retorno financeiro de Idas e Vindas do Amor (Valentine’s Day), a Warner Bros. seguiu à risca esse velho dito popular: chamou o mesmo diretor (Garry Marshall), a mesma roteirista (Katherine Fugate) e repetiu a mesma fórmula, com diversas micro-tramas estreladas por um batalhão de astros de Hollywood e que se passam durante uma data festiva. E assim nasceu Noite de Ano Novo. Mas se o estúdio parece ter encontrado uma equação de sucesso fácil, o mesmo não se pode dizer sobre a qualidade da película, superficial, repleta de clichês e extremamente preguiçosa.
E com um elenco estelar tão grande (metade do poster é dedicado só aos seus nomes), o mínimo esperado de Noite de Ano Novo seriam boas atuações. Mas aconteceu justamente o efeito inverso: talvez com a consciência de que teriam de dividir os holofotes com vários outros colegas, praticamente todos os atores aqui adotaram a lei do menor esforço. Assim, há aqueles que parecem constrangidos (Hillary Swank, Abigail Breslin), alguns entediados (Robert De Niro, Halle Berry) e outros naturalmente irritantes (Sofia Vergara, Lea Michelle, Sarah Jessica Parker). E há também Bon Jovi – que nem ator é – com uma inexpressividade inacreditável, formando com Katherine Heigl um dos piores casais no cinema em 2011. E no meio de tanta apatia, quem surpreende é – pasmem! – Zac Efron. O ator é o único que aparenta algum comprometimento maior, e é o único a injetar algum ânimo no filme, surgindo sempre bem espirituoso em cena e contagiando sua parceira Michelle Pfeiffer. Por isso, a história dos dois acaba sendo a mais interessante dentre as apresentadas, mesmo atropelada a todo momento pela montagem do longa.
Montagem essa que é apenas um dos problemas decorrentes da mão pesada do Garry Marshall. Conduzindo Noite de Ano Novo como se estivesse reproduzindo uma receita de bolo, ele se limita a ficar alternando entre as subtramas sem criatividade alguma, e sem exigir o mínimo esforço de seus atores. Excetuando as cenas na Times Square e algumas tomadas pelas ruas de Nova York, o filme é visualmente pobre, com cenários básicos dignos de uma sitcom (elevador quebrado, recepção de hospital). E em um exercício de didatismo irritante, o diretor faz questão de usar a trilha sonora do modo mais óbvio possível. Assim, cenas “engraçadas” são pontuadas por temas alegres, enquanto as falas do personagem do De Niro no leito de morte são acompanhadas de uma música triste (como se suas lamúrias não fossem claras o suficiente para indicar ao público que aquilo era uma cena “dramática”).
E palavras estão com apas no parágrafo acima pois o roteiro não faz desses momentos (e de vários outros) convincentes. Deslumbrada com o número de astros que teria à disposição, Katherine Fugate sacrifica qualquer profundidade em prol da grande quantidade de subtramas. Afinal, só isso para justificar Lea Michelle – estrela de Glee, vejam só! – ter dois números musicais. Além disso, a obviedade dos diálogos chama a atenção a todo instante, como no discurso feito pela personagem da Hillary Swank, que parece saído de propaganda de fim de ano de ano da Globo. A roteirista ainda esboça estabelecer alguma conexão entre as tramas, mas que que não soam naturais. O desleixo é tão grande que o mistério sobre a identidade da mulher misteriosa pela qual o personagem do Josh Duhamel é apaixonado é sabotado pelo próprio filme, já que ele é resolvido tão tarde que só poderia ser a única personagem que até aquele momento não havia tido sua história concluída. E não dá para não imaginar a roteirista abrindo um sorriso de auto-congratulação ao decidir que o personagem do Matthew Broderick (em uma participação especial esquecível) seria…Buellerton.
Mas, no fim das contas, o pior de tudo é a hipocrisia existente. Por baixo de todo seu discurso de paz e felicidade no ano que se inicia, Noite de Ano Novo não deixa de parecer em momento algum um grande veículo mercadológico, seja como vitrine para seu elenco, seja na avalanche de products placements existentes (com direito ao poster de Sherlock Holmes: Um Jogo de Sombras, próximo grande blockbuster da Warner, em destaque na última tomada do filme!). E enquanto essa fórmula for rentável, acho que poderemos esperar um Noite de Natal, Jantar de Ação de Graças ou qualquer filme de data comemorativa.