Um Ano de Espaço Unibanco de Cinema – Glauber Rocha

Em 16 de dezembro de 2008, após dez anos com o prédio fechado, foi inaugurado o Espaço Unibanco de Cinema – Glauber Rocha.

Nesse período de inatividade, aquele espaço quase foi transformado numa suntuosa Igreja Universal, algo próximo ao que existe na região do Iguatemi. O prédio por muito pouco não ganhou ares de casa de espetáculos, Centro de Convenções ou mesmo bingo. De todos os projetos, o que soava mais estranho e de difícil realização era o de voltar a ser cinema.

Justamente aquele espaço, que já em 1910 abrigava a Fotografia Lindemann, produtora responsável pelo primeiro registro cinematográfico em nossa cidade, Regatas da Bahia.

Em 1919, em meio à acirrada disputa eleitoral entre Ruy Barbosa e J.J. Seabra, inaugura-se o Kursaal Bahiano. Um templo incrivelmente luxuoso dedicado à sétima arte.

Em 1920, através de votação popular conduzida pelo jornal A Manhã, o Kursaal torna-se Cine Teatro Guarany. Em 1930, o Guarany exibe, de forma pioneira “O Cantor de Jazz”, primeiro filme falado da história.

Após se consolidar como o principal cinema de Salvador durante duas décadas, o cinema entra em decadência pela primeira vez e fecha as portas em 1949. Nessa época, entra em cena Francisco Pithon, o mais notável exibidor da história do cinema na Bahia. O prédio é arrendado e radicalmente modificado. Perde o ar colonizado de “escultura grega” e transforma-se numa caixa de concreto modernista.

Em 1955, o Cine Guarani (agora com o “i” ao final) é reaberto ao público, com a exibição de “O Manto Sagrado”, primeiro filme em scope produzido no mundo. Com pinturas de Carybé, lustres de Mário Cravo, O Guarani torna-se, novamente, o mais importante cinema da cidade.

Em 1959, portanto há 50 anos, ocorre a pré-estreia de Redenção, de Roberto Pires, primeiro longa-metragem de ficção realizado na Bahia. Entre 1959 a 1963, eclode o Ciclo de Cinema da Bahia. O Guarani é palco do lançamento de Pátio, Barravento e Deus e o Diabo na Terra do Sol, de Glauber Rocha; de A Grande Feira e Tocaia no Asfalto, de Roberto Pires. Entre muitos outros! O Guarani torna-se a casa do cinema na Bahia.

Em 1965, o Clube de Cinema da Bahia passa a acontecer todo sábado no Guarani. Com sessões sempre lotadas por estudantes, ali no Clube, Walter da Silveira formou uma geração de artistas e cinéfilos.

Em 1978, Francisco Pithon deixa o comando do Cine Guarani. Novo período de decadência se anuncia. Em 1981, com a morte do mais importante cineasta brasileiro, o Cine Guarani passa a ser denominado Cine Glauber Rocha. Dali por diante, uma série de arrendatários não consegue evitar o pior. Em 1998, o Cine Guarani fecha as portas.

Em um ano de atividade, o Espaço Unibanco de Cinema – Glauber Rocha levou mais de 200 mil pessoas ao Centro Antigo. Um cinema de rua com os melhores equipamentos de projeção, algo raro de se ver em todo o país. Um espaço democrático por excelência, que agrega crianças, descolados, intelectuais, mauricinhos… A elite e o povão se encontram no Espaço Unibanco.

Um cinema que coloca nas telas do curta metragem brasileiro ao blockbuster. As cinematografias tradicionais e as marginais ganham espaço nesse cinema.

Em ano de existência, praticamente todas as novas produções baianas tiveram pré-estréia no Espaço Unibanco. O Panorama e a Jornada de Cinema da Bahia aconteceram lá.

Trata-se de uma mudança gradual de percepção da sociedade quanto à importância do Centro Antigo.

Uma região que já agrega, além do Espaço Unibanco, o Centro Cultural da Caixa Econômica e o belíssimo Espaço Cultural da Barroquinha, que ameaça funcionar de forma contínua, finalmente. Em breve, surgirá o Museu da Diáspora Negra, projeto conduzido de forma obsessiva por Capinam.

Encorajados pelas primeiras iniciativas, aos poucos, novos investimentos privados chegam à região. O elegante Hotel Fasano funcionará no velho prédio de A Tarde.

Lamenta-se ainda a ausência do poder público, que não foi capaz de traçar e executar novos planos para a região.

O que se pede ao poder público? Interesse, em primeiro lugar. Depois, diálogo, planejamento e execução de obras de revitalização do entorno.

Em si, não se trata de uma área violenta, mas a sensação de abandono afasta parte considerável da população de freqüentar a região. A falta de estacionamento talvez seja o pior entre todos os problemas!

Apesar de existir diálogo generoso com diversas pessoas de dentro da Prefeitura, não existem ações concretas.

Cito, como exemplo, o caso do estacionamento da Ladeira da Montanha. Parar ali custava R$ 2,50 ao cidadão. Como não existe o hábito de se cobrar pelo estacionamento para ir ao cinema em Salvador, houve a promessa de baixar o valor. Um mês depois, aumentou para R$ 5,00. A medida inibe a ida ao Centro Antigo.

Outro exemplo, o totem que pertence à Fundação Gregório de Mattos. Está quebrado, na frente do cinema. Já houve oferta de arrumar o totem, em benefício de todos. Nenhuma resposta. Solicitou-se, então, que fosse arrancado. Nenhuma resposta, em um ano de atividade. Ele está lá, para quem quiser olhar. Totalmente quebrado!

Creio que tudo isso possui remédio, basta que observem nossas ações de forma interessada e generosa. Somos aliados, não inimigos. Queremos todos uma cidade melhor.

Para finalizar esse texto, na comemoração de um ano, dia 16/12, haverá a exibição de Superoutro, de Edgard Navarro. Para mim e muitos outros, o melhor filme baiano de todos os tempos, fora os longas de Glauber.

Para quem ainda não conhece, vale muito à pena ver um filme no Espaço Unibanco e dar um passeio no Centro Antigo da cidade.

 

Por Cláudio Marques