Por Rafael Carvalho
Sendo O Espião que Sabia Demais um filme que exala frieza e certa melancolia, o diretor sueco Tomas Alfredson parecia o candidato ideal para dirigir essa adaptação do romance homônimo do escritor John le Carré. O diretor exercita seu estilo objetivo e centrado, bem ao gosto nórdico, algo que já havia demonstrado com louvor no ótimo Deixa Ela Entrar. Mas agora, estamos na Londres dos anos 70 quando o clima soturno da Guerra Fria assombrava as relações conflituosas entre capitalistas e comunistas.
Engana-se quem espera do filme doses de ação. Ao contrário, valoriza-se aqui uma investigação psicológica, complexificada por um roteiro repleto de personagens, indo e voltando no tempo para compor o mosaico de acontecimentos que giram em torno do caso do espião duplo infiltrado no serviço secreto britânico. Dentro desse contexto, é bastante pertinente que a narrativa seja mais branda, sem adrenalina, já que o próprio conflito é de cunho ideológico.
Pois é como se O Espião que Sabia Demais fosse um filme calculado, embora isso nada tenha de pejorativo. Existe cuidado na forma como se cria uma atmosfera tanto de desânimo e opressão (tudo parece muito mórbido e desinteressante, triste mesmo), como também de tensão constante já que estamos no campo das intrigas de espionagem em que tudo e todos soam suspeitos. Daí que não surpreende que George Smiley (Gary Oldman), ex-agente agora contratado pelo governo para descobrir a identidade do espião infiltrado, passa a ser, ele próprio, um dos suspeitos.
É um filme que exige atenção do expectador para uma história que vai se encaixando aos poucos, sem mastigar informações. Há muita coisa não dita, mas que se compreende pelo decurso das imagens. A cada nova sequência vamos acompanhando os motivos pelos quais a história do agente duplo vem à tona, assim como também descobrimos particularidades, fraquezas e anseios dos próprios personagens envolvidos na intriga. Eles vivem num universo em que vida profissional interfere diretamente na pessoal, fazendo deles, muitas vezes, homens tristes que abrem mão de sua própria liberdade para servir certos ideais (sejam do país de origem ou não).
Não à toa, a música triste de Alberto Iglesias embala a narrativa acentuando mais a melancolia reinante naquele ambiente de desavenças e desconfiança do que uma investigação frenética, como era de se espera num filme de espiões. Por isso, trata-se de um trabalho insólito, chamando atenção justamente por esse aspecto conceitual, refinado na sua composição formal e dura.
É também um espetáculo de atuações. Todo o elenco, composto em sua maioria por homens, exala sobriedade, uma vez que não existem momentos de catarse, muito ao modo contido inglês de ser, apesar do perigo que ronda a vida de todos. O que existem são pessoas em estado constante de vigilância e suspeita. Além disso, toda a produção técnica é muito estilosa, desde a direção de arte cuidadosa à fotografia pálida que acentuam ainda mais o tom melancólico daquele mundo desolador. Daí, o filme ser tão charmoso, assim como deprimente, tenso, frio. Adjetivos que dificilmente caracterizam uma mesma obra. Por isso é um filme raro.